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domingo, 12 de outubro de 2014

Triste Cantiga de Roda

Me lembro de quando eu era criança
e saía a caçar borboletas
mesmo onde não haviam borboletas.
Ficava a contemplar o sol
que se repetia todos os dias,
clareando a seca, a fome, a preocupação.
Tinha vez que o sol esquentava tanto,
que diziam que o mundo ia pegar fogo.
Então, era preciso fazer penitência:
andar descalço até o cruzeiro,
a terra rachando de quente,
e pedir a todos os santos do céu
“uma gota dágua pelo amor de Deus”.
Mas eu era apenas uma criança
e a bola de gude era azul.
Esperava muito.
Por exemplo,
O dia em que o rio Jequitinhonha virasse mar.
Conheci o mar na escola
E, na época de cheia,
eu pensava que era o mar que já vinha.
Esperava até por mim mesmo.
Queria ser “gente grande”, ser “rei”.
Cresci, sem este poder.
As notícias de jornais foram mais fortes
e foi através dos jornais
que descobri que morava no “Vale”,
a região mais pobre do país
e que não éramos tão civilizados.
Ganhamos então a energia elétrica, o DDD, o asfalto.
E o “Vale” está em progresso!
Mas os jornais esquecem de noticiar
que todos os dias à noite,
as crianças não brincam mais de roda, Maria Buscambeira
e outras coisas mais.
As praças estão silentes
escondendo uma lua
que a TV se encarrega de ofuscar.
Basta!
Não precisamos mais visitar o vizinho,
contar casos de lobisomen
e brincar nos escales.
No Vale do Jequitinhonha,
os peixes não nadam mais
como antigamente

Autor: José Machado de Mattos

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